O uso indiscriminado de esteroides anabolizantes e outras drogas similares (EAS) para ganho de performance e melhora da aparência em indivíduos atletas e não atletas é atualmente considerado na literatura mundial como um problema não apenas do esporte de elite, mas sim um grande problema social e de saúde pública.
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Os esteroides anabolizantes androgênicos são derivados sintéticos da testosterona originalmente desenvolvidos no final dos anos 1930. Algumas condições clínicas específicas têm indicação médica para seu uso como o hipogonadismo masculino, raros tipos de anemia e em casos muito bem selecionados de portadores de doenças de consumo com grande perda de massa muscular, como câncer, AIDS, doença pulmonar grave, grandes queimados, entre outras.
O uso não-médico de EAS foi principalmente confinado a atletas de elite e fisioculturistas na década de 1960, que usavam como um meio para melhorar o desempenho. Nas últimas décadas, no entanto, o uso de EAS se espalhou para a população geral.
A taxa de prevalência global de uso de EAS ao longo da vida foi estimada em 3,3% de toda a população. A taxa de prevalência para os homens, 6,4%, foi significativamente superior à taxa para as mulheres, 1,6%. Os esportistas recreacionais apresentaram a maior taxa de prevalência global: 18,4%, seguidos por atletas: 13,4%, prisioneiros e detidos: 12,4%, e tóxico-dependentes: 8,0%. Além disso, a taxa de prevalência para os estudantes do ensino médio foi de 2,3%.
Na visão do usuário dos EAS o uso é aceito porque a) a mídia exalta como modelo ideal um corpo definido, magro e musculoso, com exemplos de astros do esporte, atores e cantores e outros “popstars”, b) os riscos são considerados pequenos e podem ser controlados e minimizados, c) os benefícios são considerados significativos, d) os resultados parecem naturais e podem ser atribuídos a uma boa genética e treinamento adequado, e) o corpo parece ser a forma de obtenção de admiração e sucesso, f) as atitudes em relação ao uso de são neutras ou mesmo favoráveis no seu grupo de relacionamento, e) o controle é considerado negligenciável e flexível.
Muitos usuários de EAS estão de tal forma preocupados com a sua aparência que se acham insuficientemente grandes e musculosos, consumindo suas vidas por atividades destinadas a aumentar a musculatura, como halterofilismo, dieta e uso de drogas. A dismorfia muscular ou vigorexia, distúrbio que caracteriza esse quadro, foi incluída no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, quinta edição, "DSM-5" como uma variante do transtorno dismórfico corporal.
A British Broadcasting Corporation informou recentemente que 10% dos membros masculinos de academias do Reino Unido apresentaram algum grau de dismorfia muscular. Um estudo americano evidenciou que até 10% dos fisioculturistas podem ser afetados, com estimativas conservadoras que relatam cem mil homens nos Estados Unidos.
Numerosos estudos identificaram fatores de risco para o uso dos EAS, incluindo imagem corporal negativa, idade mais jovem, o exemplo bem sucedido de outros usuários, o grande tempo gasto em treinamento físico, a preocupação exagerada com a alimentação e o uso de outras drogas ilícitas.
Um importante estudo da Islândia evidenciou uma forte correlação entre o uso de EA e de outras substâncias ilícitas e uma relação moderada com o consumo de álcool e cigarro. Alunos do ensino médio que participam de treinamento físico informal e fora de clubes esportivos formalmente organizados seriam o principal grupo de risco para o uso de EA e devem ser alvo de programas educativos e preventivos.
Embora os efeitos secundários dos EAS sejam raros ou leves em doses terapêuticas, os abusadores usam tipicamente doses 5 a 15 vezes maiores que as doses clínicas recomendadas. Em tais doses, os efeitos adversos podem ser severos e associados às trágicas complicações e mortes de atletas e não atletas.
Os usuários de EAS acreditam que podem evitar efeitos colaterais indesejados ou maximizar os efeitos das drogas tomando-os de maneiras que incluem: a) ciclos - tomando doses por um período de tempo, parando por um tempo e reiniciando, b) associações - combinando dois ou mais tipos diferentes de esteroides e c) pirâmides - aumentando lentamente a dose ou frequência de abuso, atingindo um pico e, em seguida, diminuindo gradualmente. Não há evidência científica de que qualquer uma dessas práticas reduza as conseqüências médicas nocivas desses medicamentos.
Efeitos colaterais gerais incluem a supressão dose-dependente da função gonadal, infertilidade, hirsutismo, ginecomastia, hepatotoxicidade e perturbações psicológicas, como agressividade e violência, depressão, suicídio, dependência e efeitos cardíacos e metabólicos.
Calcula-se que a mortalidade entre os atletas que utilizam EAS é 6 a 20 vezes maior que a dos atletas limpos e aproximadamente um terço dessas mortes pode ser atribuída a causas cardiovasculares. Cardiomiopatia, infarto do miocárdio, dislipidemia, anormalidades da condução cardíaca e anormalidades da coagulação são efeitos colaterais cardiovasculares bem definidos dos EAS.
O uso de EAS no esporte competitivo é rigidamente regulamentado, fiscalizado e penalizado, com inúmeras entidades e programas mundiais envolvidos. No entanto, o uso de EAS fora do esporte de elite não é abordado de forma adequada e programas e estratégias eficazes são mandatórias e urgentes para minimizar esse grave problema.
O projeto #BombaTôFora, idealizado pelo grupo da Endocrinologia do Exercício da UNIFESP em parceria gratuita com a agência de publicidade Y&R, se propôs a abordar o tema de forma ampla, envolvendo a ciência, a comunidade e o Estado para que o uso de esteroides anabolizantes e similares seja minimizado, a população esclarecida e os usuários sejam adequadamente atendidos e reabilitados.
O projeto foi, de imediato, apoiado pelas sociedades médicas envolvidas: SBEM – Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, SBD – Sociedade Brasileira de Diabetes, SBMEE – Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e do Esporte, SBOTE – Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia do Esporte e ABRAN – Associação Brasileira de Nutrologia, além do Conselho Federal de Medicina e da Autoridade Brasileira de Controle de Dopagem.
Participe dessa corrente de ação contra o uso indevido dessas substâncias. Acesso o site: www.bombatofora.com.br. Visite nossas redes sociais, curta e compartilhe nossos posts. Juntos, vamos mostrar que os danos são bem maiores do que os ganhos. E diga sempre para amigos, familiares e pacientes: Bomba Tô Fora!
Dr. Clayton Luiz Dornelles Macedo
Médico Endocrinologista
CRM-RS 14.857 - RQE 8.744
Doutorado em Endocrinologia Clínica pela Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP Especialista em Medicina do Esporte pela Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP
Chefe do Núcleo de Endocrinologia do Exercício e Coordenador do Ambulatório de Endocrinologia do Exercício, junto ao Serviço de Medicina do Esporte da UNIFESP
Professor Preceptor do Programa de Residência Médica e da PG em Medicina do Esporte da UNIFESP
Professor do Programa de Pós-graduação em Endocrinologia Clínica e Ciências Endocrinológicas da Disciplina de Endocrinologia da UNIFESP
Coordenador do Departamento de Diabetes, Exercício e Esporte da SBD – Sociedade Brasileira de Diabetes
Presidente da Comissão Temporária de Estudos em Endocrinologia do Exercício da SBEM – Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia.
Membro do Departamento de Atividade Física da Associação Brasileira para Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica – ABESO
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