A terapia hormonal tem diversos usos dentro da Medicina. Em mulheres, a reposição hormonal da menopausa está indicada especialmente para tratamento dos fogachos e dos sintomas genitourinários que surgem no período da perimenopausa e menopausa. O interesse por terapias alternativas, especialmente a feita com hormônios ditos "bioidênticos", cresceu bastante nos últimos anos. A busca por tratamentos popularmente chamados de "mais naturais" e o intenso trabalho de marketing poderiam explicar esse fenômeno. Mas existe alguma evidência de benefício entre esta opção e a convencional? Vamos aos fatos...
1- Hormônios ditos bioidênticos são iguais aos hormônios convencionais.
Hormônios bioidênticos são substâncias hormonais que possuem exatamente a mesma estrutura química e molecular encontrada nos hormônios produzidos pelo corpo humano. Podem ser fabricados tanto pela indústria farmacêutica convencional (que já faz isso há bastante tempo) quanto pelas farmácias de manipulação. Entretanto, esse termo vem sendo usado indevidamente e vendido como se fossem “novas opções de tratamento”.
2- Os bioidênticos apresentam menor pureza.
Na prática, as doses referidas nas prescrições costumam ser bastante diferentes das doses presentes nos produtos. Segundo o FDA, órgão equivalente a ANVISA nos Estados Unidos, as potências variam de 67,5 a 268 por cento do referido no rótulo ou na prescrição (1). Além disso, a absorção das moléculas costuma ser menor quando comparada ao tratamento convencional. Em outras palavras, o risco de dosagem abaixo ou acima da recomendada é muito alto, especialmente nas formas que não permitem ajuste da posologia, caso dos implantes (figura).
3- Implantes hormonais não são para todo mundo.
A terapia hormonal da menopausa tem indicações muito precisas: sintomas como os fogachos e os sintomas genitourinários (disfunção sexual) em mulheres no período perimenopausa, por exemplo. Implantes hormonais jamais devem ser prescritos com a intenção de melhorar vitalidade, sensação de energia ou aparência física. Mulheres jovens tendem a ser um grupo de maior risco. O uso de testosterona e a liberação hormonal errática do implante podem levar a efeitos deletérios na função reprodutiva, isto é, podem diminuir a fertilidade, além de possíveis efeitos colaterais como acne, aumento de pelos no corpo.
4- O tratamento com bioidênticos custa caro.
Apesar de algumas formulações custarem menos que algumas apresentações comerciais, o custo do tratamento com bioidênticos costuma ser muito maior por dois motivos: solicitação abusiva de exames na tentativa de monitorar a terapia e alto custo da consulta dos profissionais prescritores, possivelmente devido ao risco que assumem ao indicar tratamentos sem comprovação científica.
5- Não existem dados sobre a segurança da terapia com bioidênticos.
Ausência de estudos evidenciando risco não significa que o tratamento seja seguro. Significa apenas que os dados não foram devidamente avaliados ou estão sendo omitidos. Não dá pra dizer que o uso de bioidênticos não aumenta o risco de câncer de mama ou de trombose sem que bons estudos tenham sido feitos. Todo tratamento precisa ter seu perfil de segurança devidamente estudado antes de ser amplamente prescrito. É dessa forma que conhecemos os possíveis efeitos adversos, quem está mais propenso a apresentá-los e, principalmente, como devemos agir caso apareçam.
6- O uso de bioidênticos não é recomendado pelas sociedades médicas.
Sociedade médicas internacionais (North American Menopause Society, American College of Obstetricians and Gynecologists e Endocrine Society) e a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM) não recomendam tratamento com bioidênticos por entenderem que os riscos são maiores que os benefícios.
Referências:
1- US Food and Drug Administration. Bio-identicals: Sorting myths from facts. http://www.fda.gov/Drugs/GuidanceComplianceRegulatoryInformation/PharmacyCompounding/ucm049311.htm (Accessed on November 20, 2012).
2- Martin KA, Barbieri RL. Treatment of menopausal symptoms with hormone therapy. UpToDate.
3- Santoro N, Braunstein GD, Butts CL, et al. Compounded Bioidentical Hormones in Endocrinology Practice: An Endocrine Society Scientific Statement. J Clin Endocrinol Metab 2016; 101:1318-1343. Reissued October 2, 2019.
4- Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (https://www.endocrino.org.br/hormonios-bioidenticos/) e Departamento de Endocrinologia Feminina e Andrologia (DEFA).
Dr. Mateus Dornelles Severo
Médico Endocrinologista
Doutor e Mestre em Endocrinologia pela UFRGS
CRM-RS 30.576 - RQE 22.991
Texto revisado pelo Departamento de Endocrinologia Feminina e Andrologia.